Havia
pensado muito no assunto, sobretudo nos últimos dias, e a decisão estava tomada:
era hora de dizer adeus à Rebeca. Agora que escrevo, pensando e repassando os
acontecimentos do dia em minha cabeça, é que tomo consciência de que sentirei a
falta de minha “road bike”, a minha quase exclusiva Merida Reacto 400, minha
Rebeca. Sim, sentirei sua falta, mas não, não o bastante para mudar minha decisão.
O vazio que ela deixará será preenchido por minha mais amada ainda Scarlett
(Scott Spark 950+), disso eu tenho certeza, mas em muitos aspectos Rebeca será
insubstituível. Hoje pela manhã foi dia de pedalar com a Rebeca e logo ao sair
de casa percebi que o céu já sabia de minha decisão, pois, atipicamente, ele
estava nublado, cinza, carregado com nuvens de chuva.
O céu estava refletindo a
mim mesmo. Saí de casa para o que seria minha última pedalada com a Rebeca. A
medida que os km se passavam, assim como o tempo também, as gotas de chuva,
poucas gotas de chuva, caiam do céu, como um pranto em função da tristeza.
Entretanto, mesmo que estivesse me indagando se tomara a decisão mais correta,
a tristeza foi dando espaço à alegria, à euforia, e à medida que eu pedalava,
que aumentava o ritmo e elevava a velocidade, para sentir o asfalto passando
rápido por sob meus pés e o vento soprando em meu rosto, mais eu me alegrava.
Em
um dado momento, comecei a sentir um ardor nas pernas que junto com o frio da
manhã me proporcionavam uma sensação mista de cansaço e disposição. Bom,
explicando melhor (sem romantizar), há cerca de um ano, eu me tornava o feliz
proprietário de duas belas bikes, uma ‘road bike’ e uma ‘mountain bike’. A
ideia era simples: ter acesso a dois mundos do ciclismo. O plano era treinar
durante a semana com a ‘road’, pelo asfalto, e pedalar de MTB nos fins de
semana, pelas trilhas. Mas, também, e desde o princípio, a função da ‘road’ era
treinar para me condicionar para o MTB, usar a ‘road’ para poupar a MTB (já que
a manutenção da ‘road’ era irrisória em comparação a minha full-suspension),
manter a ‘road’ original enquanto customizava e melhorava a MTB. Assim, de uma
certa maneira, a Rebeca sempre foi “a outra”, então a decisão de ficar apenas
com a minha Scarlett era algo esperado. Aqui, na minha cidade, o asfalto é
deplorável, assim andar de ‘road’ é meio prazer, meio tortura. Vibrações e
solavancos a parte, como a ‘road’ era usada para o condicionamento pró-MTB, o
meu estilo de pedalar com a Rebeca era voltado ao giro (pouco
usava o coroão,
ia só de coroinha), à manutenção de elevadas rpm, a usar mais o cardiorrespiratório
que a força das pernas. Uma ‘road bike’ não foi feita para isso (que maldade
minha)! O “pessoal da speed”, daqui de minha cidade, nem mesmo me conhece, pois
eu pedalava com a Rebeca sozinho (na maioria das vezes), e assim eu não participava
da cultura do asfalto. Também, é fato, eu não conseguia rodar muito rápido com
a ‘road’ (não tenho força para isso), os meus percursos eram curtos (40-60 km),
pois os fazia no meio da semana (quando dispunha apenas de 1,5-2,0 h para
pedalar), já que os fins de semanas eram reservados para o MTB, o que me
desencorajava a me juntar aos donos de “rodas finas”.
Enfim, não me adaptei à ‘road
bike’. Com tudo isso, além de eu ter verdadeira ojeriza em possuir coisas as
quais são subutilizadas por mim, decidi por abdicar da propriedade de minha ‘road
bike’, minha Rebeca. Não sei se pelo clima de despedida, se pela sensação de
dever para com ela, em fazer uma última pedalada à sua altura, ou simplesmente
porque eu quis, foi uma excelente pedalada: rápida, forte e vigorosa. Assim me
despedi dela. Chego ao fim de uma “era” e “era uma vez” eu de ‘speed’. Adeus
minha Rebeca, que seu novo dono esteja à sua altura, lhe ame, lhe trate bem e
que você voe com ele, pois você foi feita para a velocidade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário